Por Rafael Sigollo
Economia estagnada, aumento da taxa de juros, ameaça de inflação, Pibinho, disparada do dólar. Os percalços que o Brasil vem enfrentando nos últimos anos certamente não eram esperados por multinacionais, empresários e executivos que viam o país como alternativa para a crise que atingiu mais fortemente os Estados Unidos e a Europa. As metas agressivas estabelecidas por aqui, quando o Brasil despontava como uma força emergente, ficaram difíceis de serem batidas.
Nesse cenário, a pressão por resultado aumentou de forma ainda mais drástica a dança das cadeiras no alto escalão, que começou pelos presidentes das empresas, em seguida atingiu os diretores financeiros e, agora, chega aos líderes do departamento comercial.
"É uma reação natural das grandes corporações. Muitas estão fazendo ajustes nessa área e procuram profissionais com um perfil diferente, que possam se adaptar rapidamente à nova estratégia. Enquanto isso, outras precisam encontrar substitutos para os executivos que são 'roubados' pela concorrência ou por outros setores", afirma Arthur Vasconcellos, sócio da empresa de recrutamento CTPartners.
Denys Monteiro, que recentemente assumiu o posto de CEO da empresa de recrutamento Fesa, ressalta que muita gente também está sendo trocada por não ter entregado o prometido aos acionistas. "Conheço um executivo de vendas que estava otimista, prevendo crescimento de 14%, e conseguiu apenas 8%. Fica difícil explicar para a matriz que você comprometeu o custo, mas não gerou a receita", exemplifica.
Diante disso, segundo Vasconcellos, não adianta culpar o mercado e os fatores externos. É preciso buscar alternativas e vender mesmo quando o momento é de turbulência. "Nessas horas o profissional é exigido de verdade e são poucos os que conseguem se sair bem", afirma.
De acordo com o especialista, a demanda é por alguém que "resolva o problema comercial" rapidamente, pois a paciência dos clientes atualmente é muito menor. "É preciso dar tempo para quem chega. O sucesso nessa posição depende em grande parte das relações e conexões do profissional com o mercado - que muitas vezes precisam ser construídas e aperfeiçoadas de acordo com o segmento e a organização", diz.
O recém-contratado, contudo, precisa ser resiliente e saber lidar com a pressão. "Ele já chega devendo. Precisa fazer um diagnóstico de curto prazo para entender para onde vai o próximo ciclo orçamentário e, ao mesmo tempo, pensar em soluções também para o médio e o longo", afirma Monteiro.
Dentre os que mais estão mudando seus departamentos comerciais estão os grandes grupos de indústrias - de base e transformadoras - com os segmentos automotivo, de mineração e de siderurgia. Um exemplo é Alex Feijolo, que assumiu há dois meses a diretoria comercial do grupo de origem francesa Gefco, que atua na área de logística industrial e está presente em 150 países.
O executivo, que já ocupou o posto de gerente comercial da empresa entre 2004 e 2007, aceitou voltar com o desafio de diversificar clientes, conquistar novos negócios e mais espaço no mercado. "As multinacionais já perceberam que não vai ser fácil, mas ainda têm muita expectativa de crescer na América Latina e na Ásia", afirma.
"O recém-contratado já chega devendo. Precisa fazer um diagnóstico de curto prazo para entender o próximo ciclo", diz Monteiro, CEO da Fesa
Feijolo admite que a pressão é grande, mas que a companhia oferece, ao mesmo tempo, todo o suporte necessário para que as metas sejam alcançadas. "Alguns clientes globais, por exemplo, nos ajudam a criar relacionamento também aqui no Brasil. Além disso, temos uma equipe forte e contato próximo com as filiais, especialmente no Mercosul", enfatiza.
A necessidade de trazer novos perfis para complementar seus quadros foi o que motivou a Totvs, gigante do setor de software, serviços e tecnologia, a contratar dois novos diretores comerciais no início do mês: Flávio Costa de Azevedo para a unidade de Belo Horizonte e Celso Matoso para a do Rio. Ambos vieram da SAP.
Embora acredite na recuperação econômica do país e no crescimento dos negócios, o vice-presidente de relações humanas e infraestrutura organizacional da Totvs, Alexandre Mafra, diz que talentos na área comercial são bastante disputados independentemente dos indicadores externos. De acordo com ele, o momento exige profissionais mais "agressivos" e com grande conhecimento do mercado. "A prioridade sempre é formar internamente e continuamos investindo nessa prática. Às vezes, porém, é importante trazer profissionais de fora", explica.
Os headhunters afirmam que, de maneira geral, as competências e habilidades exigidas de quem ocupa uma cadeira no alto escalão do departamento comercial têm mudado. O próprio Vasconcellos, da CTPartners, já atuou como diretor da área em diversas empresas e ressalta que já não existe mais aquele estereótipo clássico do vendedor sorridente, afável e bonachão. "A função hoje exige muito embasamento técnico e um conhecimento mais abrangente, que passa por diversos aspectos do negócio. É como se esse profissional fosse um pequeno presidente da organização", diz.
Adriana Prates, presidente da empresa de recrutamento Dasein Executive Search, afirma que muitas empresas possuem uma estrutura comercial receptiva e, em razão da desaceleração da economia e maior competitividade, estão buscando executivos com experiência em prospectar parcerias e novos clientes. "Além de representar a companhia e vender seus produtos, esse profissional precisa ter uma atuação consultiva, explorar todas as possibilidades e soluções que pode oferecer ao outro e criar uma relação de confiança para o futuro", enfatiza. Segundo Adriana, esses profissionais estão na faixa dos 35 a 55 anos e recebem uma re- muneração anual total entre R$ 400 mil e R$ 500 mil.
Com passagens por seguradoras como Mapfre, Aliança do Brasil, Nationwide e Capemisa, Nelson Paiva assumiu recentemente a diretoria comercial da Mongeral Aegon Seguros e Previdência, atraído pelo desafio de criar um novo segmento de atuação dentro da empresa. "A pressão é natural e constante. O 'taxímetro' zera todo fim do mês e as metas têm de ser alcançadas". Mesmo assim, ele ressalta que seu projeto é de longo prazo, especialmente pelas características do segmento onde está inserido. "Os ciclos são mais demorados e o fechamento de um negócio passa por diversas etapas. É como namoro, noivado e casamento", compara.
Na opinião de Paiva, é fundamental pensar "fora da caixa" para conseguir trazer resultados consistentes para a empresa e os acionistas, além de buscar novas oportunidades. "A venda tem de ser consciente."
Também com o objetivo de expandir seus negócios, a empresa carioca de sucos integrais do bem (assim mesmo, com iniciais minúsculas) contratou Rodrigo Motta, que chegou de São Paulo para assumir o cargo de diretor comercial. Na bagagem, mais de 20 anos de experiência em companhias como Nutrimental, P&G, Ferrero, Coca-Cola e Heineken.
Segundo o executivo, o assédio da concorrência se intensificou nos últimos anos e todas têm metas ousadas de dois dígitos. A mudança para a do bem, no entanto, se deu pelo desejo de participar ativamente do crescimento de uma marca ainda pequena, mas inovadora, de alto potencial e muito admirada em seu setor. "É quase uma startup, o que me dá muito mais autonomia e flexibilidade para trabalhar. A maior pressão que recebo vem de mim mesmo."
Na Dasein, Adriana estima um aumento de 30% na demanda por gerentes e diretores da área comercial em relação ao mesmo período do ano passado, sendo que cerca de 90% foram substituições. "É uma dança das cadeiras, de fato". Denys Monteiro, da Fesa, ressalta que o profissional que recebe uma proposta deve avaliar com cautela e profundidade o que está sendo colocado em jogo. "Isso significa entender exatamente as características e a cultura da outra organização, se há identificação com o produto ou projeto, como você pode agregar valor e se vai ter o que precisa para um bom desempenho", afirma.
Fonte: valor.com.br
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