Por Lucy Kellaway
Há duas semanas encontrei um homem com quem trabalhei. Conversamos um pouco e acabei contando que uma pessoa que conhecemos havia se separado recentemente da esposa e está morando com uma subordinada. Meu ex-colega cerrou os lábios e disse: "Não faço fofoca". Por dois segundos me senti envergonhada, mas então fiquei zangada com ele. Que esnobe! Como alguém pode ser um jornalista e não gostar de fofoca?
A fofoca tem um nome ruim. O dicionário Oxford a define de maneira desdenhosa como "conversa destemperada sobre outras pessoas, geralmente envolvendo detalhes não confirmados". Mesmo assim ela sempre me pareceu como um daqueles casos raros em que o prazer supera a culpa.
O estrago provocado ao assunto da fofoca geralmente é insignificante, enquanto que aquela sensação de diversão e cumplicidade criada entre os fofoqueiros é considerável.
Entretanto, segundo uma pesquisa recente da Universidade de Stanford publicada na "Psychological Science", eu não só não provoquei dano algum ao fazer a fofoca, como também ajudei a melhorar o mundo. Falar das pessoas pelas costas aumenta a cooperação, reforça o código moral, pune as pessoas egoístas e recompensa as altruístas. Se as pessoas ficam sabendo que foram isoladas por mau comportamento, elas vão se comportar melhor da próxima vez.
Se isso estiver certo, sugere que a fofoca é particularmente importante nos escritórios. Ela nos ajuda a saber quem evitar, questiona os chefes intimidadores, une as pessoas e reforça a cultura de uma companhia.
Logo após ler o estudo, fui tomar um café com um colega. Mencionei um conhecido locutor de TV com quem trabalhei no passado e disse que, embora talentoso, havia algo de estranho nele. Meu colega, que também havia trabalhado com ele, concordou. Disse que o homem era uma "prima donna" e um tirano, e que os únicos pontos de vista que ele levava em consideração eram os seus próprios.
Fiquei ali ouvindo interessadíssima e, em vez de me sentir mal, congratulei-me por ter contribuído para o bem comum ao demonstrar desaprovação aos valentões e egoístas. Mas aí, percebi uma fraqueza no sistema. Para a fofoca promover o bom comportamento, não é indicado que ela ocorra pelas costas de alguém. O alvo precisa ter ciência dela - o que é mais fácil de dizer do que fazer. Da próxima vez que me deparar com o locutor de TV, não vou me afastar dele indignada; provavelmente serei bem simpática.
Na verdade, o admirável nisso tudo é que apesar do grau de fofoca envolvida (segundo o antropólogo Robin Dunbar, dois terços de todas as conversas da humanidade são fofocas) e do quanto cada um de nós é alvo de fofoca o tempo todo, sabemos muito pouco o que as pessoas dizem sobre nós pelas costas. Não tenho a menor ideia do que as pessoas falam a meu respeito quando não estou por perto - o que pode prejudicar minhas chances de melhorar, mas torna a vida mais fácil.
A fofoca não costuma voltar para as pessoas que são alvos dela por vários motivos. Primeiro, como é basicamente secreta e geralmente considerada de veracidade duvidosa, estamos programados a não reagir a ela. Um obstáculo ainda maior é que a hierarquia supera a boataria o tempo todo. Isolar uma pessoa com base em fofocas é particularmente impossível se essa pessoa tem um cargo superior ao seu.
O mais importante é que há dois problemas com a ideia da fofoca como fonte moral e reguladora. O primeiro é que a fofoca precisa ser em sua maior parte verdadeira - o que é duvidoso dado seu viés negativo. "Oi, você ouviu falar que X é um chefe maravilhoso e que trabalha duro?" não é algo muito digno de uma fofoca. Em segundo lugar, a fofoca nem sempre é motivada por nossos valores morais. Ao fazer fofoca sobre a amante do jornalista, eu não estava necessariamente defendendo a santidade do casamento. Eu estava apenas indicando que achei a história um pouco engraçada.
O verdadeiro valor da fofoca nada tem a ver com a pessoa que está sendo alvo dela, e tudo a ver com quem está fazendo. Na semana passada, fui apresentada a um grande banqueiro que fez a universidade ao mesmo tempo que eu. Ele citou o nome de um contemporâneo famoso e então disse, em tom sóbrio: "Ele teve um passado e tanto. Nada ilegal, mas selvagem."
"É mesmo? Conte-me tudo", respondi. E, assim, ele me disse como esse empresário lendário já foi um mulherengo de primeira, o que concordamos ser surpreendente, uma vez que ele nunca foi tão bonito.
Essa fofoca não teve nenhum propósito social ou moral. Ela estava lá no passado e era irrelevante. Mesmo assim, foi valiosa, pois me revelou o seguinte sobre esse banqueiro: "Sou muito divertido, mas não totalmente confiável."
Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira
Fonte: valor.com.br
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