Veja alguns dos principais mitos sobre a aposentadoria e abandone-os enquanto ainda há tempo
Por Priscila Yazbek
Algumas ideias que temos sobre a aposentadoria podem ter efeitos devastadores no longo prazo. Achar que os gastos diminuem, que a aposentadoria durará apenas 20 anos e que você vai pendurar as chuteiras aos 65 podem tornar seu planejamento financeiro um verdadeiro desastre.
Apesar de esses conceitos serem bastante projetados e formarem uma espécie de senso comum sobre a aposentadoria, a realidade tem mostrado que eles não têm se aplicado a muitos casos. Mais do que escolher os investimentos que te garantirão uma vida tranquila lá na frente, é preciso entender quanto você precisará para se manter, sem se equivocar sobre o tempo e sem subestimar o efeito da inflação.
A seguir estão listados alguns dos principais mitos que rondam a aposentadoria, segundo especialistas no assunto. Veja e avalie se os seus conceitos sobre a aposentadoria estão equivocados.
Na hora de calcular a duração da aposentadoria, muitos fazem estimativas anacrônicas e não se planejam para o longuíssimo prazo. Segundo uma pesquisa realizada pelo HSBC, os brasileiros acreditam que sua aposentadoria durará 23 anos.
“As pessoas acham que não vão viver mais 30 ou 40 anos depois de se aposentar quando muitos vão chegar aos 100 anos e a grande maioria até os 90. Muita gente esquece que a medicina evoluiu”, afirma Renato Roizenblit, gestor de Wealth Management da SLW.
Fernando Meibak, sócio da consultoria Moneyplan e autor do livro “O Futuro Irá Chegar! Você Está Preparado Financeiramente para Viver até os 90 ou 100 Anos?” formula os planejamentos financeiros de seus clientes sempre imaginando que eles cheguem pelo menos aos 90 anos. “É preciso ser conservador e estimar sempre uma expectativa de, no mínimo, 90 anos de idade”, diz.
2) Meu filho é o meu maior investimento
Destinar todas suas finanças à criação dos filhos esperando que eles retribuam isso futuramente, sem dar importância aos seus investimentos, é um erro crasso. É a mesma coisa que colocar todos os ovos numa cesta só, um dos maiores equívocos de qualquer planejamento financeiro.
Renato Roizenblit comenta que muitos pais observam os filhos “despontando” na carreira hoje e por isso acham que eles vão lhe ajudar em 20 ou 30 anos. “De fato a grandíssima maioria dos filhos ajuda o pai, mas a relação familiar muda quando isso acontece. Até lá os filhos já terão seu próprio núcleo familiar e precisarão sustentar sua família”, afirma Roizenblit.
Ele acrescenta que a ajuda que os pais dão aos filhos hoje poderia lhes ser útil no longo prazo e orienta que sejam aceitas contribuições quando possível. “Se o filho é estagiário ele só poderá ajudar com a conta de gás, então não adianta muito, mas se ele já ganha 6 mil reais, o condomínio e o IPTU podem ser pagos por ele”, diz o gestor da SLW.
3) Meus gastos vão diminuir consideravelmente
Apesar de muitos contarem com isso, é mais difícil do que se pensa reduzir os gastos na aposentadoria. Segundo Roizenblit, basicamente, o que é possível diminuir são os gastos com os filhos quando eles se tornam independentes. “A partir do 59 anos o plano de saúde fica bem mais caro, o uso de remédios torna-se recorrente e, como sobra muito tempo livre, há mais necessidade de preencher o tempo e o item que preenche o tempo é o lazer, que gera custos”, diz.
Crer que o plano de saúde cobrirá todos os gastos também é um grande equívoco. De fato, ele sustenta uma parcela importante das despesas, mas, ainda assim, muitos gastos ficam de fora da cobertura. Despesas com remédio, enfermeiros e cuidadores são alguns dos exemplos de gastos que precisam ser pagos por conta própria e que podem ter um impacto considerável no orçamento do aposentado.
Rodolfo Amstalden, analista da Empiricus, chama atenção ainda para outra questão: por mais que os gastos diminuam, os preços aumentam e a vida mais austera pode não surtir efeito algum. “Todo mundo quer ter pelo menos mantido seu padrão de vida, mas as pessoas não têm noção do quão mais caro as coisas podem estar quando chegarem à aposentadoria”, avalia.
Além da inflação, que come boa parte dos valores poupados, também é preciso considerar que as rentabilidades das aplicações podem diminuir. O cenário atual é um bom exemplo disso. Há dois anos, investimentos em renda fixa atrelados à taxa Selic estavam em alta, mas, com o ciclo de quedas recente da taxa básica de juros, estes mesmos investimentos estão rendendo muito menos do que rendiam antes.
4) Eu posso sempre economizar mais dinheiro adiando minha aposentadoria
Contar com a postergação da aposentadoria é uma estratégia bastante arriscada. Além de não ser possível saber qual será a sua disposição física e psicológica, não se sabe quais serão as condições do seu mercado de trabalho quando o momento de se aposentar chegar.
Empresas têm aposentado seus funcionários compulsoriamente e pesquisas têm mostrado que quanto maior a faixa etária maior a dificuldade de recolocação do profissional. Resumindo: é melhor estar preparado para se aposentar antes do que o previsto do que depois.
5) Eu não preciso começar a investir agora, posso esperar um pouco mais
“Nossas condições físicas e psicológicas exigem que nós resolvamos sempre as coisas que estão à nossa frente. Temos um senso de urgência que nos faz preferir sempre o que é tangível, o que nos trará prazer hoje, em vez de pensar em 30, 40 anos”, afirma Rodolfo Amstalden.
Deixar os investimentos para depois pode tornar tudo muito mais difícil. Quanto antes o planejamento for feito, menor será o valor mensal destinado às aplicações e mais arriscada poderá ser a sua estratégia de investimento.
Outro erro comum é achar que é tarde demais para começar a investir. “Não é porque eu tenho 40 anos que eu não vou começar. Com uma boa disciplina e juntando dinheiro todo mês, em 20 ou 10 anos, é possível ter um bom avanço em relação ao fluxo futuro de renda”, diz Amstalden.
6) Vou me aposentar aos 65 anos
Os 65 anos são quase um marco quando o assunto é pendurar as chuteiras. Mas, como a vida não é nada previsível não é razoável acreditar que exatamente nessa idade você irá se aposentar.
Se por algum motivo seus planos não derem certo, um planejamento financeiro que não considerou a possibilidade de um adiantamento da aposentadoria pode dar errado. E por outro lado, se você não se preparar psicologicamente para a possibilidade de se aposentar depois dos 65 anos, caso seja necessário adiar os planos, a frustração poderá ser grande.
7) Vou investir apenas para a minha aposentadoria
Investir apenas com foco na aposentadoria é um tiro que pode sair pela culatra. O primeiro passo do planejamento financeiro deve ser a formação de uma reserva de emergência: uma poupança que permita ao investidor sustentar-se por meses diante de uma situação imprevista, como a perda do emprego ou um problema de família.
Essa reserva é muito importante para evitar que você precise resgatar seus investimentos para a aposentadoria em um momento de dificuldade. “Eu tenho um casal de clientes perto dos 50 anos. Eles tinham uma reserva para aposentadoria que, na visão deles, era confortável, mas o marido perdeu o emprego e não está conseguindo se recolocar. Agora eles terão que mudar todos os planos”, exemplifica Fernando Meibak.
8) A inflação não é importante
A inflação acumulada pode transformar rapidamente as economias de uma vida toda em uma poupança mirrada. Por isso, na hora de planejar quanto é preciso acumular, de acordo com a renda que se pretende ter futuramente, é crucial incluir a inflação no cálculo.
No planejamento financeiro de seus clientes, Renato Roizenblit imagina uma inflação de 5% ao ano. “A gente vive um momento atípico e temos uma inflação acumulada de 6,59% nos últimos 12 meses (até março). Mas para o longuíssimo prazo eu uso uma projeção de 5% ao ano”, comenta.
Para Amstalden, seria razoável perseguir uma inflação média anual de 5% a 10% ao ano. “Mas o ideal é que o investidor já invista em produtos atrelados à inflação para não precisar pensar nisso”, diz.
Investir em produtos atrelados à inflação é uma das principais orientações para quem planeja a aposentadoria. Alguns dos investimentos mais indicados são: as NTN-Bs, títulos do Tesouro Direto que remuneram o investidor com uma taxa prefixada mais a variação da inflação medida pelo IPCA; fundos imobiliários que invistam em imóveis cujos contratos de locação sejam corrigidos por índices inflacionários; e ações de empresas com receitas corrigidas pela inflação.
Mas, para investir por conta própria, é preciso se planejar e estudar as aplicações que mais condizem com seu prazo, perfil e objetivo.
9) 1 milhão de reais é mais do que suficiente para a minha aposentadoria
Algumas pessoas planejam acumular 1 milhão de reais até os 60 anos e acreditam que conseguirão se sustentar apenas com a rentabilidade desse valor acumulado, mantendo o milhão intacto até o fim. A lógica parece boa: mesmo se esse valor estivesse aplicado em um investimento conservador, como a poupança antiga, se todo mês o investidor ganhar 0,5% do valor, ele teria 5 mil reais por mês, sem tocar no milhão.
Mas, essa teoria é o clássico erro de planejamento no longo prazo. "Primeiro, você não sabe se o investimento dará sempre 0,5% ao mês. Mas vamos supor que a aplicação é a poupança pela regra antiga, que é mais garantida. Mesmo assim, hoje os produtos e serviços que eu compro com 5 mil reais, em 15 anos eu não compro nem a metade”, afirma Roizenblit.
Para Amstalden, analista da Empiricus, o antídoto para não ter problemas financeiros na aposentadoria é fazer projeções de gastos mais agressivas, sem mirar o mínimo necessário. “Coloque no papel uma vida luxuosa ou, ao menos, uma vida com alguma folga. Erros de conta acontecem, mas ao mirar o meio do alvo, por mais que a pessoa erre um pouco, ela acerta dentro, mas se mirar o mínimo, ao errar ela estará fora do que seria a exigência mínima”, diz.
Fernando Meibak opina que, para uma pessoa de classe média, um bom planejamento deve permitir que ela chegue à aposentadoria com: uma renda mensal de 5 mil reais, já descontada a inflação; uma renda proveniente do INSS (previdência social), que servirá para cobrir os custos do plano de saúde; e um imóvel para usar como moradia.
Vale ressaltar, porém, que uma renda mensal de 5 mil reais pode ser muito satisfatória para alguns, mas muito baixa para outros. Uma boa dica para saber quanto acumular até a aposentadoria é pensar sobre a sua renda mensal hoje e avaliar qual porcentagem dessa renda pode ser suficiente para te prover o padrão que você deseja manter na sua aposentadoria.
10) Só preciso pensar no meu plano financeiro e minha aposentadoria será tranquila
Apesar da situação financeira ser um aspecto muito importante da aposentadoria, planos em outras áreas também devem ser feitos. “Aquela ideia de se aposentar, colocar um pijama e sair para pescar é ultrapassada. É muito importante ter uma independência financeira, mas as pessoas precisam planejar uma atividade, se não elas ficarão em casa e morrerão de tédio”, diz Meibak.
O planejamento psicológico também é essencial para que seja possível se adaptar bem à nova situação, sobretudo se o aposentado tinha uma rotina muito intensa de trabalho.
Rodolfo Amstalden acredita que em alguns casos, inclusive, continuar trabalhando depois de se aposentar pode ser muito positivo. “O trabalho nessa fase é até mais relacionado à qualidade de vida do que à parte financeira.”
Ele acrescenta que há várias maneiras de trabalhar no estágio da aposentadoria, diferentes da que o aposentado estava acostumado. “Dedicar-se aos investimentos, por exemplo, pode ser um tipo de trabalho, mas agora o investidor começa a trabalhar para acumular patrimônio, com menos transpiração e mais cabeça”, orienta o analista da Empiricus.
Fonte: exame.abril.com.br
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