Conheça cinco limitações que levam aos erros mais graves na condução de uma empresa
Por Marcos Hashimoto*
Vários estudos já foram publicados sobre os motivos pelos quais as empresas não conseguem dar continuidade a suas operações e acabam por fechar as portas. A maioria desses estudos não só é inconclusiva, como também não consegue chegar a um denominador comum.
Para fazer uma análise mais detalhada sobre esse tema, que sempre desperta interesse em qualquer lugar do mundo, dadas as altas taxas de mortalidade de pequenas e médias empresas (eu mesmo já publiquei um estudo acadêmicocom professores do Insper em 2011), vamos nos concentrar, em primeiro lugar, nas empresas nascentes, com menos de três anos de vida. Os motivos que levam empresas já estáveis ao fracasso são diferentes dos motivos das empresas nascentes. O grau de incerteza de empresas estabelecidas é bem menor, e os motivos giram em torno de mudanças que acontecem no ambiente externo e geram instabilidade nos mercados. Há também empresas que tomam a decisão de crescer sem estarem preparadas para isso e, como já disse, colocar uma empresa de pé exige competências diferentes das necessárias para fazer crescer um negócio já estabelecido.
Outra coisa que precisamos esclarecer é o que chamamos de fracasso. Uma empresa pode ser descontinuada por diversos motivos – nem digo fechar, porque vender uma empresa como forma de sair de um grande buraco é um fracasso do empreendedor, mas não necessariamente da empresa. Vamos considerar fracasso a necessidade de se desfazer do negócio (venda ou encerramento das operações) sem que esse seja o desejo do empreendedor. Ele pode ter decidido fechar o negócio porque queria fazer outras coisas na vida e não conseguiu comprador – ou seja, ele teria a opção de continuar e até ser bem-sucedido, mas não quis. Isso não é fracasso, embora seja uma descontinuidade do negócio.
Vamos agora ao ponto-chave dessa discussão. Muitos estudos perguntam ao ex-empreendedor por que ele fechou a empresa. Tirando o fato de que o orgulho pessoal pode ser um fator que distorce a espontaneidade e a transparência de sua resposta, muitas vezes nem ele próprio sabe o real motivo do fracasso. Veja bem: a maioria dos estudos indica a falta de capital de giro como causa. Claro que nenhuma empresa funciona sem dinheiro, mas essa é uma consequência de outra causa. Poucos vão a fundo para descobrir a causa verdadeira. Por que faltou dinheiro? Porque não conseguiu vender. E por que não conseguiu vender? Os clientes não vieram. Por que os clientes não vieram? Bem, agora sim, podemos vislumbrar algum motivo real. Por que a empresa perdeu mercado? Qual foi a causa genuína?
A entrada de um concorrente maior e mais forte é um dos motivos mais citados. Outros, como fatores macroeconômicos, mudanças nas taxas de juros, variações cambiais, mudanças na legislação, alterações no comportamento do consumidor etc., têm em comum serem fatores externos à empresa. Esses não são os verdadeiros motivos, porque, se assim fosse, outras empresas do mesmo setor quebrariam na mesma época. Embora isso possa acontecer de vez em quando, como fenômeno econômico típico e até necessário para que um setor se estabilize e se consolide, não justifica o fracasso de UMA empresa. Não caia na armadilha de jogar a culpa em elementos fora do seu controle. Se você caiu onde outros, sob as mesmas ameaças, sobreviveram, existia mais alguma coisa errada na sua empresa. Não tampe o sol com a peneira e procure os fatos reais.
Agora deixe-me esclarecer uma coisa muito importante. Empresas nascentes atuam em regime de alta incerteza. No primeiro ano, tudo é um grande aprendizado – o mercado, as operações, a legislação, as pessoas. Tudo, a rigor, é motivo para não dar certo. O fracasso nessa fase não só é comum como eu arriscaria dizer até que é esperado, e representa um importante aprendizado no processo de empreender. Na maior parte das vezes, os erros não são, ou não deveriam ser, tão grandes a ponto de afundar uma empresa. Quando o empreendedor quer reduzir o risco, e já que não consegue reduzir toda a incerteza, acaba preferindo frear o impacto, ou seja, o tamanho do investimento (financeiro ou não) numa determinada ação.
Isso posto, vamos nos ater a erros recorrentes – aqueles que o empreendedor já cometeu uma vez, mas, por diversos motivos, comete de novo. Alguns chamam de burrice, outros de teimosia – há até quem chame isso de perseverança, como se fosse uma qualidade e não um defeito. Bem, esses são os piores. Eu não vou citar os erros em si, pois não caberiam todos aqui. Em vez disso, prefiro descrever as cinco limitações que levam a eles:
Incapacidade de perceber. O empreendedor fica tão focado naquilo em que acredita ou em executar o plano traçado que se torna cego e surdo ao que acontece à sua volta, recusando-se a enxergar fatos e evidências que estão na frente do seu nariz e que podem dar outro rumo ao negócio. Se isso levasse apenas à perda de oportunidades, o problema seria menor, mas o empreendedor deixa de ver ameaças que vão comprometer a qualidade de suas decisões. Se ele não percebe, como corrigir? Na verdade, tem muita coisa que ele percebe, mas não quer incorporar, não quer acreditar, não aceita porque contraria seus paradigmas estabelecidos. Orgulho e amor próprio são as causas desse mal.
Incapacidade de admitir seus erros. Por ser visto como líder, por cultivar uma forte autoimagem e por acreditar que as pessoas o respeitam porque ele deve saber o que está fazendo, o empreendedor tem muita dificuldade em admitir quando tomou uma decisão errada. E ele faz isso o tempo todo, por causa dos pressupostos que assumiu em ambiente de incerteza. Isso é normal e faz parte do desenvolvimento do empreendedor e do negócio. E não é por excesso de orgulho que ele tem essa dificuldade. É o contrário: excesso de insegurança. Admitir que pode ter tomado um caminho errado é um sinal de maturidade e um passo importante no seu processo de autoconhecimento.
Incapacidade de ler as pessoas. Não importa se são clientes, parceiros, fornecedores ou funcionários. Lidar com pessoas faz parte do dia a dia da empresa. Se o produto é fantástico, o mercado potencial é enorme e o modelo de negócio está bem estruturado, o ponto fraco geralmente é a incapacidade do empreendedor em compreender como as pessoas reagem a ele, como o interpretam, como ele é visto no grupo, qual é sua reputação, como age sob determinadas circunstâncias, a forma como resolve conflitos. Não estou dizendo que o empreendedor precisa ser um grande líder, mas ele precisa, no mínimo, cultivar algum grau de empatia no relacionamento com as pessoas. Muitos empreendedores se julgam superiores às demais pessoas e agem de forma intolerante, irresponsável e inconsequente com aqueles que o ajudam a conduzir seu negócio. As consequências são devastadoras, pois ele contrata errado, recompensa errado, faz parcerias e sociedades erradas, demite errado. Qualquer erro desses, em tempos de carência de mão de obra qualificada, pode ser fatal para o negócio.
Incapacidade de aprender. Desde que começa a desenvolver o seu negócio, o empreendedor aprende muito. Sua motivação e seu entusiasmo o levam a dedicar horas e horas lendo, estudando, fazendo cursos, falando com pessoas. Se ele continuasse com essa disposição quando o negócio já está rodando, o sucesso seria o destino natural. Acontece que ele se envolve tanto nas operações do negócio que acaba não tendo tempo para continuar aprendendo. A verdade é que a maior parte do aprendizado vem depois que o negócio começa. O empreendedor precisa ter uma visão muito ampla, principalmente na visão de negócios, em itens como controles financeiros, elementos operacionais, compreensão do mercado, entendimento das leis etc. Falta de tempo é apenas uma desculpa. O excesso de autoconfiança é a causa principal desse problema.
Incapacidade de gerir. Mesmo tendo uma boa capacidade de percepção, e sabendo lidar com pessoas e aprender com os erros, o empreendedor pode fracassar por falta de capacidade de gestão. Isso não quer dizer que basta dominar as técnicas e ferramentas de administração, mas saber como aplicá-las para cada tipo específico de negócio e como explorá-las diante das circunstâncias que se apresentam. Esse domínio é mais necessário a partir do segundo ano de vida do negócio, quando se espera que o período do improviso tenha acabado e os controles e a organização sejam mais relevantes. Para ser competitivo é preciso saber equalizar a relação entre os custos e as receitas, aumentar a eficiência dos processos, decidir onde investir para crescer, como diversificar e como definir objetivos, entre outras práticas de gestão.
Essas incapacidades sozinhas não são responsáveis pelo fracasso, mas uma combinação delas pode ser fatal se não for compensada por competências de outras pessoas, como sócios ou funcionários-chave. Se o empreendedor não percebe uma necessidade de mudança – ou percebe a necessidade, mas não está preparado para enfrentá-la –, isso se repetirá diante de todas as situações em que é preciso tomar decisões.
Como o leitor deve ter notado, não são os negócios que fracassam, mas os empreendedores que estão no comando. Ele pode pôr a culpa em um gerente, em uma máquina falha, na qualidade de um fornecedor, em um grande calote que levou do cliente, em um incêndio inesperado. São formas de mascarar o despreparo para lidar com essas circunstâncias. No fundo, o problema reside sempre na figura do empreendedor.
* Marcos Hashimoto é Coordenador do Centro de Empreendedorismo da Faap, consultor e palestrante (www.marcoshashimoto.com)
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