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Alice, Este Não é o País Das Maravilhas

Por Gabriel Rossi

É excessiva, em alguns aspectos, toda a empolgação obnubilada por parte de intelectuais e da opinião pública (em sua maioria) em torno da nova classe média – maior fatia de famílias com renda entre três e 10 salários mínimos. Não estou sendo sarcástico, senhores leitores (embora corteje - sem parcimônia - o sarcasmo). Aqui também guardo minha ironia e personalidade talvez elitista (embora prefira ser chamado de seletivo, acho a crítica (elogio?) justa se restrita, tão somente, ao meu encanto pela alta cultura, cinema sem explosivos (sétima arte de verdade) e pelo conhecimento em geral, pois precisarei delas depois. Também não rejeito, completamente, o argumento de sociólogos de que boa parte da população brasileira saiu do nível de pobreza. É verdade. Na verdade, meia verdade.

Esta classe C, excessivamente endividada, que hoje exibe sua TV de plasma ou o último modelo de IPhone, ainda vive em situações tristes e preocupantes, muitas vezes em comunidades sem saneamento básico ou em áreas de risco de acidentes geológicos, por exemplo. Por esse ponto de vista, o glamour brasileiro é uma comédia sem a mínima graça. O sonho brasileiro, ainda por esse olhar, é uma historinha boba. Demagoga. Muitas vezes tenho a sensação que este país, em questões específicas, é de quinto mundo (não vou descambar para essa discussão). Quero falar sobre marketing. Ele é minha única ideologia, acreditem. Vou parar por aqui porque não suporto pieguice...

Em um primeiro olhar, este cenário, para nós marketers que gostamos de desafios, é um mar de rosas. Mas será que estamos olhando a conjuntura sócio-político-econômica de forma inteligente e madura? Possuímos realmente a prerrogativa do argumento de que entendemos, de forma sine qua non, as necessidades, cenários sociais, carências e desafios deste novo consumidor, indiscutivelmente mais iconoclasta, influente e digital?

Vamos olhar pelo lado menos cético. Você já ouviu falar sobre o bônus demográfico? Este é o momento em que grande parte das pessoas está em determinada faixa etária que facilita o crescimento econômico. É, em suma, quando há um enorme contingente da população em idade produtiva e um menor número de idosos e crianças. Altas taxas de natalidade e de idosos agravam problemas sociais, já que essas duas “categorias” em geral não trabalham e demandam gastos. O Brasil, acredite, está exatamente no momento de seu bônus demográfico.

Sua população é majoritariamente adulta, produtiva. Um momento especial, anseio de todas as nações. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a taxa de fertilidade da mulher brasileira é hoje de 1,8 filho, em média, índice baixo, bastante próximo ao dos países ricos (1,7 filho por mulher). Isso é bom, e faz parte deste chamado bônus demográfico. Se o país aproveitar, esse bônus demográfico permitirá que a renda per capita do brasileiro aumente 2,5% ao ano entre 2010 e 2050, de acordo com projeções dos especialistas. É chance de termos uma real classe média. Sonho com esse pessoal verdadeiramente incluído digitalmente (não estou falando apenas de tecnologia), além de tudo. A inclusão digital será a verdadeira revolução do consumo brasileiro.

Na política, esse público começa a fazer a diferença. Essa nova classe C é pragmática, busca gratificação instantânea (principalmente na web), se interessa e revindica aspectos da micropolítica – proximidade das escolas, qualidade de atendimento do serviço público etc. A classe média tradicional , especificamente, está interessada em questões mais abstratas. Além disso, quem trabalha com marketing político precisa considerar que este é um segmento da sociedade que não pretende perder o que conquistou e quer continuar ascendendo, e com certeza irá punir os candidatos que não têm compromisso de estabilidade econômica. Hoje ela é extremamente valorizada porque significa perspectiva de ascensão social.

O brasileiro não tolera mais sustos financeiros como os milhões vividos na época da inflação galopante e dos mirabolantes planos econômicos que chegaram literalmente a matar pessoas. Quem não se lembra do vexatório Plano Collor e de suas inúmeras vítimas que acordaram num dia qualquer e descobriram suas economias confiscadas? Você, profissional de marketing da área, precisa pensar em micro segmentação, em conteúdo verdadeiramente relevante e eliminar os preconceitos da tal (acho esse termo derrogativo) “orkutização”. Além disso, deve pensar mais coerentemente no poder do telefone celular. Geolocalização!

Se a classe média está atenta aos políticos, imagine como está se relacionando com as empresas e os prestadores de serviços. Analisando a história das relações de consumo no Brasil, desde as conquistas democráticas até o Código de Defesa do Consumidor instituído no final de 1990 e passando também por uma competição mercadológica crescente para concorrer inclusive com empresas e produtos estrangeiros, percebe-se um aumento na plasticidade do consumo. Antes tímido até para realizar uma troca, o comprador dá mais valor ao tempo, a feedbacks e relacionamento.

As redes sociais contribuíram muito (obviamente) para essa mudança de comportamento. E o público feminino é o mais representativo. Um exemplo é a mãe acima de 30 anos (mamãe facebook) que trabalha e não tem muito tempo, mas que quando utiliza a internet o faz de modo extremamente eficiente, debatendo sobre produtos, sobre serviços, seus filhos e também sobre política. Este talvez seja o público mais cacofônico da web social.

O Brasil pintado de rosa por parte de intelectuais e da opinião pública não é o da Alice, aquela do País das Maravilhas. Como diz o ditado popular, “o buraco é mais embaixo” quando olhamos com lupa a nova classe média. E os profissionais de marketing não podem se iludir. Ao contrário, devem ser os primeiros a perceber a realidade. 


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