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Formação em Outra Área Amplia Visão do Negócio

Por Edson Valente

Se na hora de prestar vestibular e escolher qual carreira seguir existe uma divisão clara entre as áreas de exatas, humanas e biológicas, no mercado de trabalho atual conseguir transitar entre especialidades diversas é uma vantagem competitiva para executivos - sobretudo em um cenário econômico em que as oportunidades estão mais restritas.

Profissionais com boa capacidade analítica, por exemplo, têm ocupado vagas em áreas que originalmente concentram pessoas de humanidades, como os engenheiros que são cada vez mais frequentes no comando de departamentos de recursos humanos. "Eles enxergam soluções de maneira mais racional e prática. Entendem a lógica dos perfis e analisam padrões de comportamento", afirma Daniela Ribeiro, gerente sênior da empresa de recrutamento Robert Half.

A especialista ressalta que não se trata de substituir alguém com capacidade de avaliação mais voltada para aspectos emocionais e psicológicos, e sim complementar esse tipo de visão com um olhar mais frio e objetivo. "É uma função híbrida, que comporta executivos com grande bagagem em exatas", afirma.

O caminho contrário também ganha força. Atividades antes estritamente técnicas como as do setor de tecnologia agora exigem outras habilidades, que não são aprendidas nos cursos. "É essencial que esse profissional saiba se relacionar e se comunicar bem, pois ele vai precisar interagir com diversas áreas da empresa."

Finanças e marketing também têm multiplicado seus pontos de intersecção, uma vez que o caráter analítico da formação no campo financeiro é bastante útil para quem necessita de uma abordagem estatística de seu público-alvo. Outro movimento que tem se tornado comum, na percepção de Daniela, é o da migração da área de vendas para a de marketing. Nesse caso, a vantagem é que o profissional, ao atuar na linha de frente da comercialização de produtos ou serviços, passa a ter uma visão mais ampla do perfil do consumidor e a entendê-lo melhor - o que se traduz em competência na hora de trabalhar estratégias mercadológicas.

Essa transição foi apenas um entre os muitos passos que o engenheiro químico André Marques deu em sua carreira. "Muitas vezes, a melhor forma de atingir um objetivo é tentar se moldar para seguir caminhos não tão convencionais", afirma. Ele conta que, ao se formar, no início dos anos 2000, o mercado não era favorável para a engenharia. Foi o que o impulsionou a trabalhar em projetos estratégicos e de "downsizing" em uma empresa de consultoria, beneficiado por seu pragmatismo na leitura de cenários e de processos que configuram, a seu ver, transformações tanto no universo da química quanto no dos negócios.

No setor bancário, colaborou com BankBoston, Santander e American Express, onde passou a cuidar da área de inteligência de negócio e, em seguida, a gerir operações de venda. "Tornei-me gerente de marketing e mudei para a área de emissão de cartões", lembra. Em 2006, foi para a Credicard, onde exercitou seu caráter profissional mais híbrido. Ali, foi o responsável por projetos, processos e o planejamento dos orçamentos de todos os canais de venda. "Aprofundei minhas habilidades comerciais, de negociação e de alianças com outras empresas para fazer os canais crescerem". Passar por várias áreas, segundo ele, foi um movimento planejado. "Em cada uma delas, fiquei tempo suficiente para entregar resultados e adquirir conhecimento e experiência."

Ao final de 2011, foi procurado pela Englishtown, empresa de cursos de inglês on-line, que buscava alguém com competências comerciais para assumir o negócio como diretor geral. De acordo com o executivo, a receita cresceu quatro vezes em dois anos. "Ganhamos eficiência em operações de venda e processos internos. Tenho uma visão muito detalhada e muito próxima de todas as áreas devido à minha experiência", diz. Para Marques, as empresas têm trabalhado com recursos muito controlados e precisam de profissionais versáteis, de perfil mais generalista.

Murillo Marques, gerente de recursos humanos da Delta Air Lines, enfatiza que muitos processos seletivos ainda dão preferência para perfis tradicionais e buscam profissionais especializados para os departamentos de RH. No entanto, ele também já participou de processos seletivos em que ser mais generalista e ter competências distintas era uma vantagem.

Formado em economia, o executivo exerceu as funções de auditor e de gerente administrativo-financeiro em empregos anteriores. Tais habilidades, em sua avaliação, o ajudam a enriquecer as análises das opções estratégicas. Em sua opinião, uma pessoa de RH "puro" teria dificuldades para lidar com a parte de números, análise de orçamento, partilha dos lucros e resultados, acordos coletivos e o impacto dos benefícios no negócio.

Para Murillo Marques, não se pode pensar apenas em nichos - é necessário "ver as coisas na transversal e construir um cenário mais macro". O executivo conta que, em sua trajetória, sempre foi movido pela curiosidade de buscar novos conhecimentos, como ao fazer um MBA e um mestrado em psicossociologia. "É preciso ter um olhar multifacetado para o negócio. Analisar o presente e a estratégia para o futuro com base nos dados, mas de diferentes ângulos, colocando-se no lugar do acionista, dos clientes e dos funcionários."

Contudo, há ocasiões em que desenvolver um perfil híbrido é uma necessidade específica da companhia, que leva o profissional a adquirir competências que o credenciem a atuar em áreas diversas. Para Carlos Alberto Bitinas, sócio da Voc Gestão e Desenvolvimento de Pessoas, em uma fase de crescimento da empresa, por exemplo, funcionários da área de produtos, mais técnicos, terão de migrar para a de negócios e passar a lidar com atendimento a clientes.

"Às vezes, a companhia passa a atuar em um novo segmento e remodela sua estrutura. Os profissionais precisam estar preparados para esses tipos de movimento", diz. Desse modo, é essencial que os funcionários tenham interesses que não sejam apenas os de suas profissões. "Especialistas devem ampliar seu campo de visão. Isso os dará 'insights' para lidar com um ambiente em mutação", aconselha. Os gestores das corporações, porém, não podem perder de vista os pontos fortes de seus talentos ao promover mudanças.

No hotel Grand Hyatt São Paulo há a preocupação de municiar profissionais de diferentes departamentos com conhecimentos de outros, com o objetivo de facilitar o fluxo de trabalho como um todo. Durante um período - previsto inicialmente para ser de um mês, mas que poderá chegar a dois ou três -, o diretor de alimentos e bebidas, Reinaldo Queija, e a diretora de hospedagem, Alexandra Bueno, vão trocar de funções entre si.

Segundo Thierry Guillot, gerente-geral do Grand Hyatt SP, é uma oportunidade de desenvolver competências de liderança, mais que se aprofundar em especificidades técnicas. "Quando o líder não conhece bem uma área, tem que confiar em seus colegas e gerentes e escutá-los", diz. Alexandra enfatiza que a intenção é aprimorar ambas as áreas, adquirindo uma visão mais holística do funcionamento do hotel e discutindo sobre o que pode ser mudado para melhor. "O conhecimento técnico será importante, mas vamos focar o movimento de gestão de pessoas e de desenvolvimento de talentos", complementa Queija.


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