Pode até haver intenção de usar o relacionamento com o cliente em seu benefício, mas a prática ainda está muito longe de sê-lo e, mais ainda, do que esperamos que fosse
Enio Klein,
A gente escuta muito as empresas falarem do relacionamento com seus clientes, de quanto isto é importante, o quanto estão investindo nisto e toda aquela estorinha que todos conhecemos. O fato é que, no dia a dia, este relacionamento todo gera muito menos benefícios do que se imagina e menos ainda do que a gente espera.
Imagine um banco do qual você é cliente há quinze anos e onde na maior parte do tempo você aplicou o seu dinheiro. Com certeza, enquanto aplicava, você tinha isenção de tarifas, atenção de seu gerente e ofertas generosas. Porém, quando a coisa fica ruim para você, que espera algum suporte, aí sim é que vem todo o tipo de pressão. Tarifas plenas, seu gerente some e nada de juros favoráveis.
Ou seja, o relacionamento que você pensava ter com o banco simplesmente não existe. O mais interessante disso é que, tão logo a situação melhore e você volte a ter dinheiro na conta, como por mágica, todo o relacionamento volta, como se nunca tivesse sido diferente. Pode parecer ingenuidade minha, mas eu esperaria algo diferente. Algo mais equilibrado, mais justo. Mas isto fica só no marketing. Não é um banco feito para mim. É feito para eles mesmos e ponto final.
Tenho um relacionamento com uma revista especializada há mais de dez anos para a qual escrevo artigos periodicamente. O ideal seria eu receber a revista como cortesia, certo? Errado. Recebia porque fazia assinatura. Era a única forma de ter acesso aos meus próprios artigos para divulgação. Há uns anos decidi que não iria mais assinar.
Afinal, depois de tanto tempo, esperava ser reconhecido como colaborador e continuar a receber a revista. E continuei a recebe-la por bastante tempo, até que recebi uma mensagem curiosa. Ela dizia que minha assinatura venceu há dois anos, mas, apesar disto, não pararam de enviar a revista durante todos estes anos. E é verdade.
O que me espantou foi que se tratava de uma proposta de renovação da assinatura.
Ou seja, mais de dez anos de relacionamento com a editora como articulista, mas sou reconhecido somente como um assinante que recebeu a revista de graça, por liberalidade, durante todos estes anos, e que está na hora de assinar novamente. Com certeza, não era este o tipo de relacionamento que eu esperava.
Imagine que sua operadora de TV por assinatura, da qual é cliente por muitos anos. É fiel e possui um tíquete médio alto. Pelo menos você assim o considera. Com certeza você não espera, com este tempo de relacionamento, receber um chamado oferecendo um pacote melhor do que o atual. Pois eu recebi. Mais de uma vez. Ou seja, é melhor ser cliente novo do que cliente fiel. É essa a minha leitura do que eles acham que seja relacionamento com clientes.
Enfim, cada um de vocês, tenho certeza, tem casos em que se esperava uma postura diferente de seu fornecedor, baseada no tempo de relacionamento, mas obtiveram um tratamento totalmente incompatível. Muitas vezes sequer sabem que você é cliente.
Minha conclusão é simples: relacionamento com o cliente é ainda muito mais uma retórica de marketing do que algo que pode agregar valor para os dois lados. Mas, como diria a letra do Fado Tropical de Chico Buarque e Ruy Guerra, "Meu coração tem um sereno jeito e as minhas mãos o golpe duro e presto, de tal maneira que, depois de feito, desencontrado eu mesmo me contesto. Se trago as mãos distantes do meu peito é que há distância entre a intenção e o gesto...".
Pode até haver intenção de usar o relacionamento com o cliente em seu benefício, mas a prática ainda está muito longe de sê-lo e, mais ainda, do que esperamos que fosse.
Fonte: ADMINISTRADORES
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