Por Flávio Cordeiro
Utopia foi a palavra escolhida por Sir Thomas More para batizar uma ilha que seria a sede de uma sociedade ideal. Dizem que a inspiração de More foi a “nossa” Fernando de Noronha, cuja descrição, feita por Américo Vespúcio em Mundus Novus, instigou a imaginação de muitos homens cultos da época.
A palavra Utopia imediatamente nos remete à noção de ideal impossível, mas as marcas inovadoras têm a capacidade de modificar esse padrão: para elas, o aspecto mais importante da utopia não é o “ideal”, mas sim a ousadia de imaginar o “ideal” - o que é bem diferente.
Ao utilizar o exercício da Utopia, os inovadores entram para o seleto clube das marcas que têm uma estratégia (que é a capacidade de imaginar “um futuro” e criar mecanismos para viabilizá-lo) e agindo assim, se distanciam da concorrência, pois a maioria dos mortais mal consegue cuidar da gestão (maximização da eficiência no presente).
Existe uma sutil diferença entre imaginar “o” futuro - tarefa dos futurólogos e imaginar “um” futuro (o futuro da nossa marca) e trabalhar para torná-lo realidade - tarefa dos estrategistas. Mas como ter certeza que estamos imaginando o futuro certo? Não há certeza! Inovação envolve riscos, alguns fracassos e com eles aprendizados que vão sendo aos poucos incorporados ao processo de diferenciação.
As cinco dicas mais importantes para abastecer um exercício de Utopia, baseadas na nossa experiência prática liderando workshops de aceleração de inovação são as seguintes:
1) Comece pelo Benchmark Direto: qual o comportamento de mercados em estágios mais avançados ou maduros? O que é possível aprender / incorporar com essas experiências? Quais as razões dos fracassos? Que tecnologias / processos podem ser "traduzidos" para nosso negócio?
2) Busque Aprendizado Lateral: que tal olhar para categorias laterais à nossa e verificar como negócios fora de nosso segmento resolveram problemas comuns. Foi assim que a indústria automobilística, especialmente Crysler e GM, incorporaram da Apple o conceito dos Genius - os atendentes nerds / experts que sabem tudo acerca de cada produto e transformam cada dúvida numa certeza absoluta de compra.
3) Exercite a Distopia: recentemente assisti a uma pesquisa global do The Boston Colsulting Group sobre o mercado consumidor feminino. O estudo listava as mais graves insatisfações das mulheres com produtos, serviços e com a forma com que as marcas se comunicam com elas: insatisfações que vão de produtos mal projetados até a incapacidade de desenvolver um senso de comunidade. Para marcas inovadoras insatisfação = oportunidade! Imaginar o que trará (ou já está trazendo insatisfação) às pessoas é um excelente exercício de Distopia (o reverso da Utopia).
Marcas inovadoras usam Distopia para solucionar insatisfações. Um exemplo conhecido é Dove, que capturou a crescente insatisfação das mulheres com a "venda" de um padrão de beleza inatingível e se propôs a mudar esse paradigma e a patrocinar iniciativas reais nesse sentido. Quais são ou serão as principais fontes de insatisfação dos consumidores no seu mercado nos próximos anos?
4) Ouça as Antenas da Raça: Ezra Pound, o grande poeta norte-americano, uma vez disse que os artistas são as antenas da raça porque têm canais abertos para capturar o que a humanidade, só depois de algum tempo, será capaz de compreender. Observar o que está acontecendo nas cenas artísticas (música, teatro, artes plásticas, performances etc.) continua e continuará sendo uma das melhores formas de exercício de Utopia. Acrescentaria outras "antenas", especialmente a dos sociólogos (como Manuel Castells, Donald Inglenhart entre outros), que estão com o dedo no pulso das principais transformações sociais em curso no mundo.
5) Tenha Coragem: Nelson Rodrigues dizia que o sujeito com baixa autoestima não consegue nem atravessar a rua para comprar um Chicabon. As empresas com baixa autoestima perdem a capacidade de imaginar. A perda da capacidade de imaginar nos leva a tentar repetir os sucessos do passado confundindo imaginação com ilusão. Frases como “No tempo em que lançamos aquele produto...”, “Que saudade quando as margens eram...”, “No meu tempo, o mercado...” são indicadores certeiros de falta de imaginação. É preciso coragem: primeiro para abandonar esses e outros vícios que impedem o exercício da Utopia e depois para exercitar a destruição criativa de práticas, crenças e paradigmas obsoletos.
A tradução literal de Utopia seria algo parecido como “nenhum lugar”, poucos entenderam a ironia de Thomas More: é claro que não se tratava de chegar até o ideal, mas de imaginar o ideal para expandir os limites do possível e da imaginação. Muitas das ideias "absurdas" de More foram se tornando realidade aos poucos; muitas delas permanecem "absurdas"; mas para as empresas e pessoas inovadoras, o absurdo de hoje é o market share de amanhã.
Fonte: www.mundodomarketing.com.br
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