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Onde Heróis Não São Bem Vindos

Resolver problemas nem sempre é a solução esperada dentro das empresas



Na maioria das empresas, são premiados os heróis, aqueles personagens que surgem para resolver grandes problemas quase sempre emergenciais ou inesperados através de criatividade, inteligência ou arrojo. Esse sucesso muitas vezes é reconhecido por promoções e carreiras meteóricas.

Mas há também empresas em que esses personagens não são muito bem aceitos. Na semana passada, estive visitando uma empresa lean madura, pois vem implementando essa filosofia há quase 10 anos, quando revi um ex-aluno que fora recentemente contratado como o novo gerente de produção.

Ele dissera que estava muito animado pela oportunidade, pois na empresa de onde vinha, lean era visto meramente como um conjunto de técnicas de manufatura que, apesar dos sucessos iniciais, estava com dificuldades de progredir. E mais ainda, reconheceu que conseguiu uma oportunidade única por saber que a empresa que o recém-abrigara não tinha a política de buscar fora seus colaboradores mais qualificados, preferindo promover internamente.

A empresa estava contratando gente de fora porque seus colaboradores estavam sendo atraídos pela concorrência com grandes vantagens financeiras e achavam que poderiam buscar no mercado algumas pessoas com experiência técnica, dado que não havia sido possível ter o tempo requerido para formar internamente as pessoas com a qualidade que se esperava.

Perguntei a ele como estava se sentindo nesse novo ambiente. Suas respostas mostraram certa ambiguidade. Reconheceu que algumas das diferenças mais importantes eram a ênfase que a empresa dava para a formação de lideranças através do processo de solução de problemas práticos através do coaching interno, que havia muita disciplina no acompanhamento dos planos de ação, que havia um estado futuro sendo implementado para tudo, que havia um compromisso efetivo das pessoas com aquilo com que se comprometia, entre outros pontos que o entusiasmaram bastante.

Mas, depois de uma troca mais profunda de opiniões e experiências, ele se sentiu mais a vontade e começou então a questionar alguns pontos da empresa. Relatou uma situação que lhe pareceu surpreendente, confusa e contraditória.

Contou que a linha de produção sob sua responsabilidade havia parado há pouco tempo por falta de materiais, tendo se perdido 25% da produção na parte da manhã. Essa falta fora ocasionada pela quebra de um caminhão que entregava JIT para a empresa e o estoque de segurança desses itens era muito pequeno.

Há muito, a empresa havia parado com a política antiga de seguir com a produção, mesmo sem dispor de todas as peças, para depois retrabalhar no final do processo de produção, quando todas as peças estivessem disponíveis.

Porém, após a regularização do abastecimento dessas peças faltantes já no início do período da tarde, ele foi capaz de mobilizar toda a sua liderança na fábrica e os colaboradores e conseguiu, aumentando a velocidade da linha, na mesma tarde, recuperar todo o atraso e chegar ao final do dia com exatamente o volume planejado de produção para aquele dia.

No dia seguinte, contou a história para seu diretor que se mostrou extremamente indignado com a solução dada. Como vamos saber agora que tivemos um problema? Como o pessoal da logística vai pensar em contramedidas e planos alternativos para evitar que isso ocorra se para eles ontem foi um dia normal? E quais foram os riscos em termos de ergonomia e segurança aos colaboradores que trabalharam com maior velocidade? E os perigos para a qualidade? E mais, se era possível produzir mais com os mesmos recursos, isso significava que o dimensionamento da carga de trabalho estava equivocado?

A reação do diretor deixou-o perplexo. Afinal, ele demonstrara poder de reação, consegui a colaboração de todos os seus colaboradores e resolveu o problema, não deixando a produção atrasar. Não seria esse o seu papel?

Ele não entendeu quando o diretor disse que ele deveria ter deixado o problema emergir para que todos ficassem sabendo de sua existência e que, assim, os responsáveis fossem atrás da causa raiz para evitar que ele voltasse a acontecer.

Talvez aí ele comece a entender a diferença entre expor problemas para poder resolver e o modus operandi tradicional de “apagar incêndios”. No primeiro caso, o importante é a prevenção que não faz surgir heróis. Nessa empresa, heróis não são bem vindos.



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