O Pau
Nosso de Cada Dia
Escreveu não leu o pau comeu...
Ah se fosse verdade. Se isso fosse uma realidade a violência seria apenas um problema pedagógico onde bastaria um amplo plano de erradicação do analfabetismo que contemplasse entre os seus objetivos específicos a inserção destes analfabetos funcionais que escrevem e não leem, para que os mesmo se transformassem em leitores daquilo que escrevem e assim deixariam de ser devorados no pau prometido pelo ditado popular. Não é assim a realidade, pois o pau hoje come em quem escreve, mas não lê, em quem lê, mas não escreve, em quem escreve e lê, quem só escreve ou em quem só lê, enfim todo mundo entra no sapeca iaiá.
Quando saio de casa, seja lá qual for a hora, seja de carro, ônibus ou a pé raramente vejo, principalmente no trânsito, um semblante calmo do tipo, agradeço por mais um dia e que este dia seja feliz e harmonioso. De forma alguma é isso que ocorre, o que contemplo são carrancas de afastar bons espíritos onde as pessoas, sejam jovens mulheres homens ou velhos. Até os velhos meu pai eterno! Com aquela cara de boxeador antes de começar a luta pelo título mundial da descortesia, naquele instante, em que um lutador olha para o outro e faz a maior cara de malvado para que o oponente se sinta acuado e pense: Este cara vai acabar comigo...
A cara de malvado é uma constância no nosso dia a dia, e os que fazem as caretas assustadoras não são os bandidos temerários, chefes de boca de fumo ou procurados pela justiça não, são caras de malvados feitas por pessoas comuns mesmo.
A violência na Ilha de Vera cruz atingiu, e não é de hoje, índices insuportáveis, não que isso venha a ser nenhuma novidade. Há tempos faço a avaliação de que o brasileiro e um povo pacífico e cordial seja uma visão equivocada. Não é nem nunca foi, principalmente entre nós mesmos, se considerarmos a quantidade de revoltas desde que Pero Vaz de Caminha anotou as característica físicas das nossas indiazinhas. Temos registrado nos anais da história quase noventa conflitos de vulto onde morreram levas e levas de patrícios, onde podemos, só para ilustrar, citar no Século XVIII: Guerrilha dos Murás - índios contra luso-brasileiros (século XVIII), Guerra dos Emboabas - confronto entre bandeirantes e mineiros, São Paulo e Minas Gerais (início de 1700), Revolta do Sal - Santos (1710), Guerra dos Mascates - confronto entre comerciantes e canavieiros, Pernambuco (1710-1711), Motins do Maneta - sublevações ocorridas em Salvador contra o monopólio do sal e aumento de impostos (1711). Século XIX: Conspiração dos Suassunas - conspiração abortada independentista, Pernambuco (1801), Incorporação da Cisplatina - invasão e anexação do Uruguai ao Brasil (1816), Revolução Pernambucana - revolta independentista e republicana, Pernambuco (1817), Revolta da Vacina – Rio de janeiro em 1904 até a Guerrilha do Araguaia (1967-1974). Quem quiser maiores detalhes sobre estas e outras dezenas de revoltas, marchas, lutas, revoluções e outras pancadarias do gênero podem consultar http://pt.wikipedia.org/wiki/Revoltas_no_Brasil.
Estes tantos conflitos fratricidas no Brasil podem justificar o que eu defendo há muito como uma característica dos brasileiros, de não sermos tão mansinhos ou acomodados como insistem em alardear algumas pessoas de que o povo brasileiro é um bloco de bundões. Alto lá, desconheço historicamente algum país no mundo que seja tão guerreiro e lutador, não é bem assim que a charanga toca, sei que estes são dados relativamente superficiais que carecem de maiores aprofundamentos por isso, antropólogos de plantão mãos à obra.
O que anda me preocupando não é somente a violência nos conflitos por pontos de drogas ou de drogados que matam por nada para obterem o que eles acham ser a divina panacéia e nem falo dos covardes dementes que matam porque um parafuso está frouxo, me preocupa a violência gratuita e democrática que todos estamos expostos dioturnamente.
Pessoas de boa formação que não são desprovidas de bens materiais, tampouco possuem algum distúrbio mental ou emocional, estudantes freqüentadores de ótimas escolas e universidades e bem orientados pelos pais, o cidadão comum que é um bom pai de família e os bons filhos, estão entrando em estado de decomposição pela ótica de um comportamento anti social para com o outro, não há urbanidade nas filas dos pontos de ônibus ou no trânsito onde cada um acha que tem o direito de ocupar aquele espaço e é incapaz de parar seu veículo por poucos segundos ou dar lugar ao outro. Dar passagem ou ser ultrapassado significa perder espaço, ser passado para trás, ficar em situação de inferioridade...
Ora ora minha gente, são apenas uma vaga no ônibus ou alguns poucos metros a mais em um trânsito caótico e emperrado, vai fazer realmente alguma diferença estes metrinhos cedidos?
É fato conhecido por todos que a criminalidade cresce nos grandes, médios e até em pequenos centros urbanos em todo Brasil e as pessoas andam assustadas, pois uma parcela significativa desta população já foi vítima direta ou teve algum amigo ou familiar vitima de assalto, latrocínio, e outros tipos de agressão. Assim, ficam todos atentos e na defensiva, prontos para atacar como ação preventiva frente a uma possível violência.
Este comportamento se transformou em uma bola de neve que parece já ter fugido completamente do controle, somos vítimas e agentes da violência diária onde a conversa como forma de resolver algum problema parece não fazer mais parte do nosso repertório de convivência em sociedade.
Assisti um desenho do ursinho Puff (ou Pooh) em que ele vai parar em uma cidade onde é nomeado xerife por falta de opção, ninguém queria ser. Um bando de touros malfeitores entram no ambiente e o líder do bando diz que não suportava xerifes e que ia arrebentar com ele. O ursinho Puff perguntou “Será que a gente não pode resolver isso com um abraço?”
A solução proposta não tem o nível exato de testosterona exigida pela brigada dos machos brigões, realmente pode não ser uma solução muito máscula. Mas obedecidas as devidas proporções, porque tudo deve ser resolvido com cara feia, insultos e brigas? Se certamente procurássemos, como dizem os gurus da paciência contar até dez, respirássemos fundo e imaginássemos que aquilo que esta acontecendo não fará a menor diferença em nossas vidas e que sequer lembraremos daquilo dentro de 24 horas podemos nos questionar. Vale a pena brigar por isso ou é só um capricho?
Praticar a cortesia hoje não é somente uma questão de boa educação e urbanidade, mas também uma questão de sobrevivência. Se eu me desarmo com relação ao outro é provável que ele se desarme com relação a mim também, porque depois de iniciado um processo de violência que pode começar com uma cara feia e descambar para socos pontapés e até tiros, ninguém mais tem controle. Deve-se buscar um comportamento que não permita que isto se inicie, senão o que nos resta é pedir que Deus livrai-nos do mal amém.
Marco Antonio Cordeiro
Administrador e escritor
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