É cada vez mais comum abrir o próprio negócio sem largar o emprego fixo. Quatro empresários revelam como conciliam a dupla jornada
Por Wilson Gotardello Filho
Os dias da semana começam às 4h30 da manhã para o empresário Márcio Siqueira, de 36 anos. Em meia hora, ele toma banho, um café rápido e segue para seu escritório de contabilidade, o Siqueira & Associados, em Ribeirão Preto. As ruas vazias da madrugada na cidade do interior de São Paulo fazem com que os cinco quilômetros que o separam do destino final pareçam metros. Na sequência, próximo das 5 horas, ele inicia o expediente e checa todas as atividades realizadas pela empresa no dia anterior. Antes das 8 horas, quando os funcionários começam a chegar, Siqueira discute as atribuições de cada um e organiza reuniões com clientes e fornecedores. Às 9 horas, a rotina de empresário chega ao fim. A partir de então, ele assume o cargo de supervisor administrativo financeiro em um shopping center da cidade. Quando sai do serviço, muitas vezes ainda tem compromissos de empresário a cumprir (sem contar as horas extras dedicadas ao negócio aos sábados). Como ninguém é de ferro, ao menos ele dorme cedo, por volta das 20h30. Siqueira sintetiza um grupo de empreendedores cada vez mais comum no Brasil: os que também são empregados. Condição muito comum em países como os Estados Unidos - onde 9,6 milhões dos 20,5 milhões de empreendedores não têm o negócio próprio como principal fonte de renda, segundo o U.S. Census Bureau -, tem se tornado cada vez mais fácil encontrar brasileiros que viram empresários sem abrir mão do emprego fixo.
Das cem franquias negociadas pelo grupo Cherto no ano passado, 32% dos empreendedores trabalhavam em empresas. Nos primeiros três meses deste ano, essa proporção saltou para 43% (dos 65 negócios fechados pela consultoria).
"Essa situação é mais comum do que imaginamos", diz Marcelo Aidar, coordenador do centro de empreendedorismo e novos negócios da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo. Situações de crise, como a atual, impulsionam a busca de uma atividade alternativa, pois a confiança na estabilidade do emprego diminui e a possibilidade de garantir uma renda extra representa um atrativo. "Ter uma segunda fonte de renda dá mais tranquilidade", diz Marcus Andrade, de 26 anos, que concilia o emprego de gerente de serviços do instituto Endeavor com uma franquia do restaurante japonês Koni Store.
PLANEJAMENTO
Ao mesmo tempo em que conta com Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), plano de saúde e outros benefícios no shopping, o empresário Márcio Siqueira calcula que 30% da sua renda líquida vem do escritório de contabilidade. A segurança que uma dupla jornada proporciona a esse grupo de empreendedores é inegável, mas eles também são movidos, como todos os empreendedores, a paixão. Apesar da exaustiva rotina, Siqueira afirma que faz tudo por satisfação pessoal. Formado em ciências contábeis, as atividades de supervisor financeiro do shopping o afastam do seu ofício de escolha, frustração compensada nas madrugadas no escritório.
Renda adicional, entretanto, vem com risco extra. Empreendedores de meio período devem redobrar os cuidados na hora de contratar os funcionários. Como não vai estar presente boa parte do tempo, é preciso se cercar de profissionais de calibre. "Procure um sócio ou negocie parte do negócio.
Esse funcionário precisa se sentir dono, assumir riscos e responsabilidades", diz Aidar. Siqueira optou por trabalhar com um sócio e também distribui à equipe bonificações no início de cada ano e em temporadas de muito trabalho, como nos meses que antecedem a declaração de Imposto de Renda. "E eu já tinha trabalhado com alguns dos meus funcionários em outras ocasiões também. São pessoas de confiança", explica.
O empresário Marcus Andrade começou a planejar o novo negócio há seis meses - concomitantemente ao agravamento da crise internacional. Para dividir as responsabilidades, optou pela sociedade com o irmão. Segundo ele, é fundamental contar com alguém focado no dia a dia da empresa.
Para compensar a ausência das 9 da manhã às 6 da tarde, não teve jeito: Andrade passou a trabalhar após o expediente como executivo e nos fins de semana. "Estou lá todas as noites, sei o que vendeu no dia e a projeção para o dia seguinte", diz. Além disso, ele tem acesso remoto a diversas câmeras de segurança instaladas no restaurante. "De vez em quando entro para ver como estão as coisas", afirma.
Fonte: pequenas empresas grandes negocios
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