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Coluna do Marco - Minha Luta Com Mike Tyson


Minha Luta Com Mike Tyson

Um, dois, três...nove, dez, acabou, não levanta mais ... 

E o novo campeão mundial de boxe é Marco Antonio, derrotando o até então insuperável Mike Tyson com nocaute no terceiro round... 

Evidentemente como menino eu também já sonhei em ser jogador de futebol, fazer gols, ser o ídolo das multidões, admirado e respeitado pelo meu grande talento, talento futebolístico do qual nasci desprovido e tampouco o desenvolvi. Porém durante muito tempo da minha juventude eu acalentava mesmo era o sonho de ser lutador de boxe e de derrotar ninguém menos que Mike Tyson, o furioso pugilista que assombrava o mundo distribuindo no atacado e no varejo seus violentos golpes que destruíram muitos adversários bem maiores que ele nos idos anos 80. 

Este sonho em momento nenhum da minha juventude foi um objetivo, um alvo ou como podem chamar os estrategistas em administração, foco de médio ou longo prazo que merecesse alguma atenção especial para alcançar isto. Nunca me planejei para tal, sequer iniciei qualquer atividade de me levasse o mínimo que fosse próximo de um ringue de boxe. 

E por que disto? 

Porque convictamente muitas vezes acreditei que existem batalhas que eu não teria a menor chance de ganhar e esta certamente era uma delas. Este era somente um dos sonhos que eu sabia ser impossível para meus dotes e claro, por isso nunca me meti a besta. 

No transcorrer da minha relativamente curta vida, mesmo antes do sonho de ser pugilista, fui aprendendo as duras penas sobre outras batalhas que eu pretensiosamente pensei poder vencer, no entanto a prática me mostrou, depois de apanhar mais que galinha para largar o choco, que não adiantava nem começar uma coisa que eu certamente não iria lograr êxito. Bem, sei claramente que esta minha opinião sobre alguns fatos concretos não tem nem um tiquinho que seja a ver com mensagens de autoajuda... ou quem sabe... me aprofundando e pensando melhor nesta questão filosófica, pode até ser... acreditando que pode vir a ser de grande ajuda ou autoajuda poder conhecer algo que me alerte sobre meus limites e que é importante identificá-los e quem sabe superá-los com pensamentos positivos, treinamentos, desenvolvimento da visão holística sobre o ambiente em que estou inserido e mais montes de blá, blá blá motivacional dos papas da arte em dizer que você só fez e pensou de maneira equivocada até o magnífico e iluminado momento de encontra-los. Esconjuro de cometer tal disparate e pretender apontar qualquer direção para quem quer que seja. O que pretendo são relatar minhas próprias vivências e os limites, os vários limites que se apresentaram para que eu os vencesse ou para meu aprendizado e desenvolvimento constante causassem uma baita frustração em alguns momentos quando fui derrotado por eles. 

Para ilustrar um pouco ao que me refiro, posso dar a isso o nome de jogo de cartas marcadas, ou aquilo que não se pode vencer. Conheço uma história do velho oeste americano, o que faz todo sentido haja vista que nunca ouvi falar em história do velho oeste brasileiro ou japonês, em que um cowboy, jogador profissional, entra num bar e avista um índio encostado numa parede, chegando-se ao pele vermelha o cowboy perguntou se ele sabia jogar cartas. O velho índio respondeu: 

- Mim só sabe jogar caxanga. 

O cowboy, valendo-se de sua experiência com as cartas acreditou que poderia aprender o jogo rapidamente e desafiou o índio. 

- Podemos jogar caxanga apostado? 

O índio aceitou, tomou assento numa cadeira e distribuiu três cartas ao cowboy ficando com três. Assim que foi colocado o dinheiro na mesa o índio abaixou suas três cartas e gritou: 

- Caxangaaaa 

E puxou o monte de dinheiro para si. 

O cowboy prestou bastante atenção, e pediu uma nova partida jogando com volume maior de dinheiro. 

Da mesma forma o índio distribuiu as cartas, e assim que o dinheiro estava posto sobre a mesa o índio gritou: 

- Caxangaaaa 

E novamente limpou a mesa socando todo o valor para os bolsos rapidamente. O cowboy então percebeu a regra do jogo e pediu uma revanche do tipo tudo ou nada, no que foi atendido prontamente pelo adversário. 

Colocou todo o dinheiro na mesa, e o índio fez o mesmo. Distribuídas as cartas, o jogador assim que recebeu as suas se apressou em gritar: 

- Caxangaaaaaa 

E já ia arrastar a pilha de dinheiro em sua direção quando o índio calmamente mostrou-lhe suas cartas e disse: 

- Caxanga real, mim ganhou de novo... 

E é assim que é, 

E tem neste universo das dificuldades, algumas aprendizagens da vida amorosa dos meus primeiros anos, aquele em que se esta, ou imagina que esteja como postam hoje em dia os namorados das redes sociais, num relacionamento sério com a menininha de sapatinho amarelinho da quinta série, mas certamente se ela descobrisse que estávamos namorando, terminaria o romance na mesma hora. Sendo mais específico em impossibilidades amorosas, relato minha experiência com uma mulher mais velha, eu com onze e ela com dezessete. Minha avozinha que muitas vezes me levava para excursões, numa delas fomos assistir o Holiday on Ice, uma programação americana com um bocado de gente patinado no gelo, e que fazia muito sucesso nos anos 70. Neste dia minha avó levou também uma comadre que levou a filha, e a mocinha por falta de opção sentou-se ao meu lado. No decorrer da cansativa programação fui colocar minha mão na arquibancada quando acidentalmente encostei, na mão da moça... Como ela não retirou imediatamente a mão imaginei, que poderia iniciar ali um romance, não aquele como eu tinha com a menininha do sapatinho amarelinho, um romance de verdade com direto a pegar uma mão e quem sabe, pegar na outra mão também. 

Fui ousado, não retirei minha mão, ao contrário deixei ali e aproximei mais ainda meu braço juntando-o ao braço da moça, a noite poderia durar toda a eternidade, claro, desde que eu pudesse brincar de forte apache e de bolinha de gude no outro dia. 

Não precisei esperar o dia amanhecer para ter reconhecida minha maturidade e minhas possibilidades nesta relação, no intervalo entre os atos do show a mocinha educadamente, virou-se para mim e perguntou bem baixinho, quase sussurrando: 

- O que você está fazendo? 

- O que pensa que eu posso querer com você? 

E arrematou 

- Eu tenho dezessete anos e você é uma criança pra mim... 

Filha da mãe, minha vingança tardia é que ela agora é velha e tá mais pros sessenta eu ainda vou pros cinquenta. Na época até recebi o impacto daquele pé na bunda com muito equilíbrio e sensatez, falei pra minha vovó Maria não levar aquela menina feia e boba da próxima vez que a gente fosse ao Playcenter. 

Também fazendo parte da aprendizagem em não meter a mão em cumbuca, há no meu passado um papel de justiceiro do qual me imbui e acabei com mais uma informação transformada em conhecimento. 

Numa feia manhã de chuva fininha de um dia de aula qualquer da semana ia eu seguindo para a escola, quando avistei uma cena que mexeu com meu senso de justiça, um menino batia em outro bem menor e este ficava choramingando pelos cascudos recebidos. Cheguei perto da confusão, protegido pelo meu guarda chuvas e lancei o desafio: 

- Você é muito covarde, deveria procurar alguém do seu tamanho pra bater. 

- Em quem? Questionou o menino que coincidentemente era do meu tamanho. 

- Em mim, por exemplo... 

Corta a cena e minutos depois aparece o Marco Antonio retomando seu caminho para a escola, guarda-chuva quebrado e os fundilhos da calça encharcado por cair de bunda numa poça d’água, patrocínio do molecote que batia no molequinho. Como cereja na cobertura do bolo, a imagem do molequinho rindo bastante dando a entender ter se divertido muito com minha ridícula situação de herói fracassado. 

Por vezes esqueci-me desta ingratidão e acabei me metendo de novo em brigas que não tinham nada a ver comigo, mas estas são outras histórias. 

Nas minhas experiências na área comercial de algumas empresas, e quem já foi ou é profissional desta área sabe bem do que se trata, era estipulada uma meta mensal de vendas. A justificativa para as metas, segundo as técnicas de administração de vendas é que estas eram estimadas tomando como base o volume histórico dos negócios do setor, sazonalidade do produto, necessidade de obter valores que viabilizam a contratação do empregado e seus custos, a lucratividade da organização, investimentos no estoque etecetera, etecetera e mais um tantão de eteceteras avalizando a prática. 

Para mim, quando me informavam da cota era o mesmo que informar que eu deveria subir no telhado sem escadas. E no decorrer do mês ia aprendendo os caminhos, quais os produtos que poderiam render mais, os mais fáceis de vender, aqueles que poderia negociar melhor, enfim ia me adaptando ao que era imposto e com dois meses ou três, pronto, a cota era coberta com certa facilidade, ou adequando o discurso, as metas passavam a ser tangíveis. Passava um mês, dois e certamente no terceiro, ou no máximo no quarto mês em que as metas eram atingidas, lá vinham novas metas condicionando aquele ganho ao atingimento dos novos patamares de vendas. E não adiantava nada argumentar das dificuldades das novas metas, pra ganhar praticamente a mesma coisa teria que trabalhar bem mais. 

Vai reclamar? De jeito nenhum, a porta da rua sempre é a serventia da casa. E lá ia eu subir no mesmo telhado sem escadas, só que desta vez com as mãos amarradas. 

No campo intelectual também sofri com minha falta de capacidade de vencer desafios, devido minha limitação de compreensão das coisas que não são fáceis pra mim e que acabou me levando a contar com a sorte. 

Prestei meu primeiro vestibular para História e mesmo indo a uma boate na véspera para o lançamento no mercado do Keep Cooler que era um vinhozinho gaseificado danado de gostoso e mesmo chegando para fazer a prova com a cabeça pesando uma tonelada e um gosto de corrimão de gafieira na boca, consegui me classificar muito bem no vestibular. E novamente a pergunta se repete: 

E por que disso? 

A resposta pra mim fica na ponta de língua e completamente fora da tabela periódica, ou seja, porque não havia perguntas de Química nas provas... 

Eis que resolvo fazer novo curso superior na Universidade Federal da Paraíba. Quase vinte anos depois de concluir o segundo grau, inferi que seria necessário estudar algumas disciplinas que eu não tinha domínio, ou seja, cobrir com uma meia social meu calcanhar de Aquiles. E qual seria a disciplina que deveria ter mais cuidado? Resposta correta, Química. 

O professor do cursinho era muito competente, pelo menos os meus amiguinhos de classe diziam isso e devia ser mesmo, pois tinha gente que levantava a mão, fazia perguntas que eu nem saberia formular e ele as respondia e os coleguinhas se davam por satisfeitos. Detectei um problema de idioma entre eu e o mestre, ele falava sessenta minutos e eu captava sessenta segundos... deixava de entender seu dialeto logo após o Boa Noite Turma, depois disso ele falava em russo e eu entendia em iorubá. 

Tendo a sensação de trabalhar como ajudante de pedreiro na torre de Babel, continuei indo as aulas todas as noites na esperança de entender algo, de captar alguma coisa ou como se por milagre eu passasse a desvendar os segredos da Química como quem recebe uma revelação divina. Era esta minha esperança, porém aula após aula eu ia me sentindo como cachorro perto da mesa em casa de gordo, nem adiantava ficar olhando, não ia sobrar nada, nada iria cair no chão para que eu apanhasse. 

Cheguei à hora da verdade, eu iria me encontrar com aquela que tanto me fez sofrer, a avaliação de Química, olhei para a prova e analisei pergunta por pergunta, ponderei as assertivas, analisei se realmente a opção que havia escolhido por contemplar de maneira clara aquilo que a questão pedia seria de fato a resposta correta e utilizando o método científico do minha mãe me mandou escolher esta daqui, mas como sou teimoso escolho esta daqui, conclui que arriscaria demais abrindo um leque de opções que poderiam me induzir a errar muito mais. Então deixando de lado as ponderações escolhi a letra “C” para todas e cravei de cabo a rabo, resultado, três perguntas de Química respondidas corretamente, com certeza trezentos por cento mais do que eu acertaria tentando resolver contando com meus conhecimentos, o suficiente pra eu entrar no curso. 

Então me pareceu que seria isto, meu comportamento diante de situações adversas poderia mudar, experiências anteriores inclusive também me mostraram que o bicho as vezes não é tão feio quanto parece e que um caminho viável pode ser enfrentar mesmo sabendo que as chances são reduzidas, a gente nunca sabe do que um lance inesperado pode nos oferecer como possibilidade de vitória. 

Porém o instinto de preservação ainda fala mais alto, e assim mesmo depois de tanto tempo imaginar que possa existir a mínima possibilidade de ter que subir ao ring com Mike Tyson, só posso declarar que me mandem logo uma prova de Química para eu cravar a letra “B”, afinal um raio não costuma cair de novo na mesma questão. 


Marco Antonio Cordeiro
Administrador e escrevinhador


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